regressos quase perfeitos

tinha referenciado o título há dias, ontem tive oportunidade de o comprar;

que maravilha;

sou suspeito, pois claro, sou um incondicional admirador da guerra colonial, não do ponto de vista institucional e/ou militar, mas social, cultural, político; não consigo imaginar o que terá sido retirar jovens com 18, 19, 20 anos de aldeias recondidas do nosso país, que nunca tinham visto outro céu que não o da sua aldeia e serem atirados para outro continente, deixados no mato, prontos para matar e defender a pátria; ao regressar que com olhos reviam a sua aldeia, o céu onde brincaram e amaram, as companhias que tinham deixado, os mais velhos que os questionavam sobre o orgulho que sentiam de ter o filho ao serviço da pátria;

por outro lado, estou, como todos aqueles que estejam acima dos 40 anos de idade, preso e amarrado ao que foi a guerra colonial; tive primos que a ela fugiram, a minha avó, em casamente de segundas núpcias, foi para luanda e dela guardo inúmeros postais que me enviou; um vizinho da porta do lado, por lá esteve, outro de lá não regressou;

regressos quase perfeitos tem ainda uma outra virtude para a minha leitura, a dimensão antropológica e etnográfica que lhe foi conferida na construção do seu objeto de estudo;

depois tem aquela coisa, a recuperação e a reconstrução da memória, não uma reconstrução fiel, rigorosa, nem sequer exaustiva, é uma reconstrução de sentimentos, é uma reconfiguração ou uma recomposição que decorre de tudo aquilo que sobrou depois de tudo o que se sentiu e se viveu; devolve ao "sujeito a criatividade" (p. 30) de outros escreverem o vivido, o sentido;

finalmente, este trabalho, que é o resultado de uma tese de doutoramento, é também a reconfiguração de um país, de nós mesmos, não é um re encontro de nós, será mais um outro ponto que marca novos princípios, outras lógicas, outro nós, outro país, outro portugal que se re descobre na reconfiguração das suas memórias;

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